segunda-feira, 18 de julho de 2011

Permita-se...

9:00 horas da manhã. Calvin acabara de entrar no escritório do Dr. Berto Santana, deitara diretamente no divã, aguardando para o início da seção. O Dr. Berto entrou na sala trajando de suas vestimentas de sempre, a camisa social em tom cinza e a calça preta, os óculos esguios depositados na metade do eixo nasal, a planilha em seu colo e a caneta pronta para suas rotineiras anotações.

Calvin apanhou uma maça na fruteira ao lado do divã, a observou por um período e logo lhe deu uma abocanhada com força, em sua frente a velha estante de livros. Percorria os olhos na esperança de achar o título que lhe promovesse a começar sua análise. Não encontrou...

- Sem idéia de por onde começar? – Indagou o doutor.

- Procurando a melhor forma... – Respondeu o rapaz sem mais delongas.

- Comece pelo começo, cru e sem teatralidade. – Opinou Dr. Berto sem tirar a caneta e os olhos do papel.

Era sexta-feira, noite, Calvin havia se aprontado para sair, um pub novo havia sido aberto na cidade e por ventura fora presenteado com entradas para a inauguração. A noite não prometia muita coisa, as últimas noites haviam sido monótonas e sem nada demais, não lhe parecia que esta seria diferente. Chegou ao pub e sentiu a vibração do lugar, inúmeras pessoas procurando por uma noite de prazer e diversão ao mesmo tempo, exalando feromônios em seus jogos de sedução e conquistas, olhares sendo trocados e drinques sendo tomados. Dirigiu-se ao bar e logo em seu azar uma moça muito bonita, morena, de cabelos negros e olhar profundo esbarrou-se em Calvin, derramando sobre ele um copo de Campari que logo transformou um pedaço de suas veste na cor vermelha.

- Perdão... me desculpe, por favor me desculpe. – Suplicou a moça, que ao olhar o rosto de Calvin sorriu, com o sorriso veio uma cova em sua bochecha da qual não pode deixar de ser notada por Calvin.

- Tudo bem, eu trouxe uma jaqueta e pela temperatura sei que vou usá-la – Respondeu ele.

A mulher vez menção de quem iria puxar assunto, porém Calvin lhe deu as costas e seguiu para o balcão. Após alguns drinques e olhares, sentou-se, ao seu lado sentou-se também uma mulher loira, em seus fartos lábios depositava-se um batom de tom vermelho, tal que contrastava com o tom muito branco de sua pele, seus olhos carregavam um tom de malícia e suas mãos percorriam o contorno da taça de Dry Martine por ela carregada [...]

[...] as luzes encontravam-se no estado de penumbra, pelo quarto as roupas estavam espalhadas, dois corpos nus traçavam uma dança, num ritmo forte, sobre a cama. “Eu te amo”, “Como não te encontrei antes?”, “Em que mundo você se perdeu?”, “Você é meu mundo”... as vozes se misturavam na mesma medida que as línguas, as peles ardentes se tocavam, trocas de carícias deixavam seu cheiro pelo ar, o suor evaporava sobre a pele, os cabelos se trançavam entre os dedos, as respirações se uniam na mesma freqüência.

Logo amanheceu, Calvin encontrava-se deitado sobre as cobertas, olhos fixos no teto, sua mente vagava por um lugar não identificado, seu olhar era vidrado como de quem acabara de usar entorpecentes. Um suspiro atrapalhou o momento de silêncio, a mulher colocou-se sentada a borda da cama, levantou e vestiu-se. Calvin a olhou se vestir, sem expressão, sem diferença, sem emoção. Ela entrou no banheiro e o rapaz continuou em sua posição, sem mover-se, exceto pela sua respiração, qualquer um poderia jurar que ali jazia um homem morto. Até que Calvin levantou-se, dirigiu-se até a sua calça, a garota saíra do banheiro, Calvin abriu sua carteira, apanhou as notas e entregou-lhes.

- Você acredita que seja capaz de amar Calvin? – Indagou Dr. Berto.

- Não.

- E o que te leva a pensar dessa maneira? – Indagou novamente o doutor.

- Nada, eu cheguei a esta conclusão sem caminhos, meu coração é frio, não consigo imaginá-lo entregue a alguém. – Respondeu o rapaz sem pausa.

Calvin saiu do escritório e dirigiu-se ao estacionamento, mais um dia perdido com meras análises, nada de proveitoso retirado de seus pensamentos. Era hora de voltar à agência, Ricardo estaria o esperando para terminar o projeto da Clorosoda. Quando cruzou a saída do prédio assustou-se com uma moça que vinha em alta velocidade e falando ao celular, em instantes o esbarrão não pode ser evitado, a mulher carregava um copo de café nas mãos, que derramou sobre sua blusa branca.

- Perdão – Disse Calvin... no momento em reconheceu o rosto fino, moreno e de cabelos negros.

- Acho que estamos quites... – Sorriu a moça, seus olhos pareciam ônix quês brilhavam ao sol, sua cova na bochecha fora notada. Seu sorriso era leve e mal pode notar que naquele mesmo instante o próprio Calvin estava sorrindo.

Caminhou até o carro, quando entrou olhou pelo retrovisor, ficou alguns instantes olhando ela caminhar, até que decidiu sair do carro. Correu atrás dela...

- É... já que derrubei seu café. Será que posso lhe pagar outro? – Perguntou Calvin com as bochechas completamente coradas.